TANATOLOGIA

arte de bem morrer


O termo da vida é um estádio inexorável para todos que requer dos circunstantes e assistentes um singular conjunto de competências.Todavia, ninguém, começando pelos profissionais da saúde (médicos, enfermeiros e congéneres), é preparado para acompanhar e assistir os seus familiares, os pacientes e os moribundos, auxiliando-os a morrer em paz e a vivenciar plenamente os estados intermédios de consciência que hão-de percorrer após abandonarem este plano de existência.A actualidade do tema é indiscutível, ou não fora a Morte, que carece de nome próprio, mas é descrita no livro de Job (XXVII, 22) como "um ser inteligente" e no Apocalipse (VI, 8), "sentada num cavalo branco", o derradeiro e magno mistério susceptível de desvelar a natureza e destino da humanidade, sem embargo das suas inúmeras assunções idiossincráticas.
Morrer é expirar, isto é, exalar o último suspiro, ideia arcaica e, todavia, perene, porquanto bíblica, segundo a qual a alma (anima e spiritus) é da natureza do vento... sopro divino diz o Genesis (II, 7).
Natural, por conseguinte, a admissão da morte como resultante da fuga desse sopro divino pela boca: "Tendo a alma na boca", diz com propriedade Garcia de Resende, reportando-se à agonia de D. João II 18.
O senso comum assevera que três modalidades muito distintas de morte há, face às quais a atitude dos circunstantes varia em conformidade: morre-se de velhice, de doença, ou de forma violenta (suicídio, homicídio ou acidente), a denominada má morte.
 
Face ao constatado, que influências terão concorrido para a imagem suja e negativa da morte hodiernamente dominante no contexto nacional? E que terá causado a descrença na vida após a morte, património nosso e avoengo?
Apontam-se três ordens de factores cruciais:
1. Por intermédio de uma "pedagogia do medo" a Igreja logrou fazer triunfar a ideia de que um cristão deve estar constantemente preparado para a morte, porquanto esta chega, inesperadamente, a qualquer momento (mors certa, hora incerta).
A catequese e a pregação, mas também a literatura e a arte instilaram o receio de uma eventual morte súbita, impeditiva do arrependimento dos pecados e da expiação das faltas cometidas.
2. A morte de Deus e a concomitante laicização da soteriologia cristã da salvação individual, propagandeada pela filosofia iluminista e doravante instalada nas mentalidades enquanto corolário da recusa de assumir a transitoriedade da vida.
3. A medicalização da morte, insidiosamente induzida sob a capa das preocupações higienistas, as quais aprofundaram o medo ao proclamarem que inúmeros indivíduos eram enterrados vivos pela Igreja.
Com esse argumento e a garantia da extensão do tempo de vida (esperança de vida, ou prolongamento artificial dela) o médico substituiu definitivamente o padre à cabeceira do moribundo.

 

Alguns dos temas que este seminário visa sondar, numa perspectiva compreensiva e holística, bem assim como apontar formas mais consentâneas de cuidar e, em suma, de devolver a dignidade ao processo de transição na sua globalidade.

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